O que vocês têm na cabeça?
A Confederação Brasileira de Futebol (CBF) pronunciou-se oficialmente a respeito de Dunga, o técnico. “Não corre risco. Absolutamente”, demarcou o secretário-geral, Walter Feldman, em entrevista à agência Reuters.
Por vezes, podem ser irresolutas essas entrevistas com nascedouro na CBF. Dificilmente sabemos quando se trata de figura de linguagem.
Coisa de 10 dias após o 7 x 1, o recém-nomeado coordenador de seleções da CBF, Gilmar Rinaldi, apresentou as credenciais a uma nação preparada para abraçar a revolução como se abraça um filho que voltou da Sibéria:
“No jogo da Alemanha, uma coisa que me incomodou foi o boné. Acho que a frase tinha que ser ‘Força, Bernard’. Tinha que ter o nome do jogador que fosse entrar.”
O boné? Os presentes se entreolharam… Vai que é uma metáfora.
Cinco dias mais tarde, Dunga era reconduzido ao cargo de técnico da Seleção Brasileira — o que deixou meio claro que não era só Rinaldi que acreditava no boné como malogro — e pactuou:
“O que não me agradou mesmo foi aquele gesto de chegar todo mundo com ‘Força, Neymar’ escrito no boné. A mensagem que passou foi: perdemos um guerreiro.”
Não era uma metáfora.
Especializando-se na arte de se livrar de poucas e boas, Neymar voltou a desfalcar o Brasil no desenrolar de uma competição oficial. Pela preleção um ano antes, sentimos falta de um boné bordado com “Força, Robinho”. Houve quem temesse pelo pior: vai que alguém arriscava um “Força, Marin”…
No desembarque do fiasco da Copa América, a versão 2015 do walk of shame ensaiou novo ícone fashion, o capuz. É ele, agora, o responsável pelas mazelas do futebol nacional. Encapuzados assim, no padrão Protocolo Fantasma, não parecem jogadores profissionais, e sim peladeiros. Vampeta, campeão do mundo em 2002, a emendar etílicas cambalhotas na rampa do Palácio do Planalto, é que sempre foi um alento para quem prega a cartilha do profissionalismo.
Crítico literário fascinante e um dos poetas mais interessantes do século 19, Stéphane Mallarmé brincava a respeito do vício em charutos, justificando que a fumaça, diante dos olhos, ajudava a moldar a realidade. A nossa (fumaça, e não poesia, lamentavelmente) não se dissipa com nenhum bafejo. Fica impregnada às coisas que temos na cabeça e a bobices das quais não conseguimos nos livrar.
Mallarmé é ainda um bom exemplo (para qualquer coisa que se queira) quando se trata de simbolismo(s). Seus últimos trabalhos experimentavam conteúdo e forma de modo a antecipar toda uma caixa de ferramentas adotadas no século 20.
Com referência assim, talvez até valha uma releitura da frase do secretário-geral da CBF, Walter Feldman: “O Dunga não corre risco. Absolutamente”, ele disse. O Dunga nós notamos…
Esta coluna é originalmente publicada às terças no Correio Braziliense